29/12/2010

Em Chamas

Em Chamas


E queima. O corpo, a alma, o futuro desnudo.
E queima. O sobejo físico químico orgânico.
Querer adormecer, querer girar. O querer ser, mais que estar.

Ensurdecedor ruído, microfonado. Inquietador silêncio, nos olhos.
As noites seqüenciais. A insistência. Quase desistência.
Os sinos brandos da capela
Repelem os sentidos. De novo.

Os abrigos de outrora? Por terra.
Os amigos de sempre? Arruinados. E cansados.
Os cânticos sacros não mais demonstram
A afeição empalidecida.

Os cachos capilares dourados, lindos e limpos
Sugerem diafaneidade. Correspondem a tal idade.
Voar? Intensificar? Calar? Fechar as janelas?
De qualquer forma, paradoxalmente.

E assim se fez o infinito, menos infame.
E assim se fará.
Queimando. Em chamas coradas.

26/04/2010

Ícaro


Ícaro

Não há princípio nem fim.
Não há razão ou falta dela.
Deixe-me, deseje-me,
Esqueça-me, recrie-me.

Doces mentiras, como tantas outras.
Hoje tão esquecidas, como tantas outras.
Exalte-me, crucifique-me,
Ajoelhe-se, odeie-me.

Sentindo a falta, a fadiga,
Travestido de um deus ateu.
Carregado, andarilho,
Insatisfeito, incompleto.

Na janela há um recado óbvio,
Ficar ou partir.
Deitado, desarmado,
Confuso, esquecido.

Como músicas inacabadas,
Como quadros quebrados,
Como poesias esquecidas,
Como filmes incompreendidos.
Sou.

11/04/2010

O Vácuo e o Tempo

O Vácuo e o Tempo


Velhos amigos,
Novos ritmos.
Velhas tentações,
Novas versões.

Eu e meus velhos métodos.
Novos sonhos enfumaçados.
Nossas velhas considerações,
Adquirimos novas aversões.

O bom e o velho álcool na garganta,
Os novos heróis desconhecidos.
As velhas e hilárias tosses,
As novas maneiras de escarro.

Semelhanças?

05/04/2010

Mãos Lentas


Mãos Lentas


Mãos tão lentas
Tentando mover o que ainda resta de seu mundo,
Que já não sabe se o pertence
Ou se a ele pertence.

Um dia tão calmo,
Com copos de café gelado.
Sem charme de notas de dólares
Nem feridas visíveis sobre a pele.

Pés tão cambaleantes
Lutando contra as calçadas tortas,
Surrando sapatos de mentira
E chegando ao lugar-nada.

Uma noite tão noite,
Daquelas que nos esquecemos.
De labaredas azuis
Queimando gravetos nas ruas da lua.

Vamos jogar cartas?
Vamos correr atrás de cometas?
Vamos acender cigarros?
Vamos nos fingir de mortos?

Já é mesmo tarde?
Ou ainda cedo demais?
Usualmente não durmo antes das seis.
Da tarde ou da manhã.

17/03/2010

O Habitante


O Habitante


Quantos castelos serão por suas mãos construídos?
Quantos deuses por sua fé serão evocados?
Quantas vezes por seu amor serei chamado?

Em seu ventre renascerei,
Em seus seios me alimentarei,
Em seus cabelos nadarei
Em direção aos céus de antigamente.

Desejo-te em elegante francês.
Odeio-te, te esqueço, por vinte minutos.
Em medos vãos, em vôos rasantes.

Em planos, em improvisos.
Devoro-te em dois dias,
Amo-te, te guardo, por trinta anos.

12/03/2010

Curta Poesia Inculta

Curta Poesia Inculta


Aceito-me. Açoito-me. Tenho em cores as dores vívidas de outrora
E em tela branca a presença do hoje.
Vagarosamente revivo a própria morte, nas infames e ilustres presenças
De meus deuses pequeninos.

Salvo-me. Despeço-me. Não há nada que me mude sem se mudar. Partir e repartir, com uma única camisa.
Ternamente, o ar que me permitem, eu respiro. Com estilo. E tempero
A desistência com iguarias de meu norte, meu próximo norte.

Num gole de café, de mar, de vodka. Num cigarro.  Com a voz embriagada, como um cão de madrugada.
Deito-me, corto-me. Quando a arte finda, linda, brevemente sorrio, em um silêncio de quem ninguém quer despertar.

Entre a noite e o dia, descubro os dissabores de ser eu. De ter sobrevivido. Sou novo, de novo. Em caos.
Canto-me, espanto-me, jogo-me, levanto-me.
Seguro-me fortemente em seu vestido. Verde.



05/03/2010

221

221



Em dado momento, 
Já não sabia se o sangue era meu ou seu.
Nem mesmo se era sangue!
Talvez fossem as cores da vida pulsando 
Sobre nossos corpos.

19/02/2010

Ainda Sem Título

Ainda Sem Título

Duas horas com minha filha e meia com um advogado. Pronto! A vida já me parece mais justa. Mais alguns comprimidos e ela parecerá inteiramente perfeita. Por hoje. Por Perfect Day, de Lou Reed.

08/02/2010

Palácio de Egley


O Palácio de Egley


E seu palácio torna-se meu,
De desenfreadas orgias a dois.
Entre tons, recortes, nudez
E belos pêlos,
Pelos encantos marginais.

E um monumento ergue-se imponente,
Rubro e perfeito,
Rendendo-se à fantástica
E amorenada cidadela que o domina.

E queima,
Flamejante, infame,
Tendo suas chamas extirpadas
Pelo sacro néctar da vida,
De todas as vidas,
Mais ainda das nossas.


01/02/2010

AUA, BEMA, AENRIA


AUA, BEMA, AENRIA



   Tarde descoloridas,
Quadros, plásticos, quadrados,
Famílias, armadilhas, lágrimas,
Abraços, abismos, retratos.

Pétalas de rosa,
Amor, humor, terror,
Parede, foguete, sabonete,
Calor, ventilador, tremor.

   Heróis decapitados,
Invasão, inversão, evasão,
Arte, Marte, sorte,
Visão, tesão, aversão.

Sangue sobre papel.

21/01/2010

Enquanto Houver Estrelas

Enquanto Houver Estrelas


Eu, que caminho sem destino,
Que nunca sei o que pensar,
Tenho na velha mala a absurda certeza
De não mais ter como opção o regresso.

Eu, que venço sem merecer,
Que às vezes penso em desistir,
Visito o frio inferno agridoce
Sem lágrimas escorrendo pela face.

Eu, que peco pela inconstância,
Que constantemente perco a calma,
Deixo dominar-me com desdém
Sem lhes dar razão.

Eu, que não quis crescer,
Que tive roubada a própria escolha,
Tento somente não extinguir
O pouco que me parece restar.

Eu, que abuso da hipocrisia,
Que finjo todos os dias,
Com sorrisos brilhantes e de mentira
Faço o mundo se ajoelhar.

Eu, que desfaço e refaço sonhos,
Que abandono o apego pela vida,
Deixo para trás as frágeis palavras
Apenas para possuir algumas estrelas.


17/01/2010

Entre o Louco e o Cadáver



Entre o Louco e o Cadáver


Hoje vamos nos encontrar no topo daquele prédio.
Vou me jogar,
Vou te empurrar,
Ou vamos nos abraçar e pular.
Quantos vão chorar?

O menino louco procura um hospital,
Quer se curar.
A menina feia faz muitos planos,
Quer se casar.
Eu apenas escrevo com meu próprio sangue,
Quero entender.

Celas vazias,
Lendas reais,
Letras escarlates,
Espectros no portão.
Devo sair?
Aonde ir?
Ao jardim noturno conversar com o dicionário
Ou ao planetário ver o que há de novo no Espaço?

Noites apocalípticas.
Enquanto o asfalto molhado transpira lamentações,
Dionísio nos aguarda na entrada de seu templo.

Saberemos o que fazer?


11/01/2010

Além das Nuvens



Além das Nuvens


Folhas de papel, de outono,
Início calculadamente atrasado.
Fim do dia, da noite,
O início de ambos.

Meus olhos vermelhos e cansados
Querem justamente o repouso.
Meus pés relutam em dançar
Ao som mudo da valsa flutuante.

O ruído repetitivo do relógio na parede.

Subo até o sino da igreja
E pulo para voar sem deus.
Acordo de novo,
Há novos sinais.

Ao meio-dia, sinto uma triste alegria,
À meia-noite, sinto-me depressivamente feliz.

Encontro-me encontrando-a,
Assusto-me assustando-a,
Asfixio-me, enveneno-me.
É assim que temos planejado.

Intenções, propósitos e razões,
Cores vibrantes e tons transparentes.
Motivos absurdamente eficazes,
Chuva e transformações.

O inverso também é real,
Ou até um pouco mais.

O sono é a morte,
O sonho é o que somos sem controle.
O despertar é a morte,
E o resto ainda desconhecemos.

Tememos o invisível
E cremos no que há além das nuvens.


08/01/2010

Retrato em Preto e Branco



Retrato em Preto e Branco




Neste quarto de duas mil imagens,
Falta-me uma.
Tantas figuras quebradas
Fora de seus errados lugares.

Nesta sala de sete mil palavras,
Faltam-me duas.
Quantos sussurros ainda terei que ouvir
Até adoecer.

Você. Um sorriso. Eu te amo?

05/01/2010

A Vida Secreta De Romeu



A Vida Secreta de Romeu


Ontem Romeu sorriu
Perdido num aeroporto,
Com flores brancas nas mãos.

Ontem Romeu chorou
Com o adeus sem dó,
Na esquina vadia.

Ontem Romeu cansou
De esperar milagres,
E assistiu uma ópera triste.

Ontem Romeu cantou
O rock triste do cantor morto,
E rezou.

Ontem Romeu escreveu
Um bilhete sagrado:
"O amor é eterno".

Hoje Romeu morreu,
Envenenado e sozinho.

03/01/2010

Infarto

Infarto

Recluso, inerte, maldito intruso sou.
Em qualquer caminho, perco-te, perco-a,
Antes mesmo de percorrê-la.

Regresso, pálido
E com olhos cerrados,
Ao princípio.

Nas mãos sem gestos,
O absurdo segredo é revelado:
Há dois dias e três noites
Findava de meu coração
Os derrotados pulsos.

Isto é Sobre um Céu de Desenho Animado

Isto É Sobre Um Céu de Desenho Animado Ela dorme em seda rosa E também em grama verde. E ela sabe tão pouco sobre o mundo Que at...